Escrito por: CNTE
“É inadmissível”, diz diretora da CNTE sobre ter que pedir aval para não ter mais filhos
Foto: Jefferson Rudy/ Agência Senado
Mulheres de todo país celebraram a aprovação do Projeto de Lei (PL 1941/2022) que reduz para 21 anos a idade para a realização de laqueadura ou vasectomia, sem a necessidade de autorização do cônjuge, pelo Senado Federal no último dia 10. Mesmo sendo visto como uma vitória, a Lei precisa ser sancionada por Jair Bolsonaro, o que gera um pouco de cautela na comemoração.
“Esta Lei é a conquista da luta das mulheres, mas é preciso fazer um recorte. Esse foi um posicionamento do Senado Federal e a gente tem que ainda lutar muito para que seja concretizado sem o veto presidencial. A questão é que a gente conhece a postura que o presidente tem tido em relação às pautas das mulheres”, explica a secretária de relações de gênero da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), Berenice D’Arc Jacinto. “Ainda falta sancionar a Lei e a gente sabe que direitos como esse é um avanço, a gente sempre lutou por isso. Ainda hoje as mulheres precisam que alguém na família dê permissão à ela de fazer o procedimento no corpo dela para não ter mais filhos, é inadmissível”, complementa.
A professora do Distrito Federal, Ana Diolina Álvares de Amorim, lembrou que durante muito tempo a bancada feminina lutou para que a mulher tenha autonomia sobre o próprio corpo e disse que esse projeto é um grande avanço da luta de mulheres no Congresso Nacional, principalmente no cenário onde os direitos delas vivem sob constantes ataques.
Segundo ela, o Estado não garante políticas públicas de qualidade para amparar essas mulheres na sociedade, que em sua grande maioria é responsável pelos cuidados e cobrada por essa composição familiar.
“Quando a gente vai observar a quantidade de mulheres que é obrigada a pedir demissão depois da licença maternidade é assustador. É importante que a mulher possa decidir sobre seu próprio corpo, se ela quer ou não ter filhos e quantos ela quer ter”, ressaltou ao contar a sua experiência pessoal.
A professora foi mãe de um filho aos 21 anos e decidiu por fazer a laqueadura depois do nascimento da criança, mas não conseguiu. Ela conta que mesmo com a autorização do então marido não foi permitido devido a idade. Na Lei atual só com 25; se sancionado, o PL também autoriza a laqueadura ou a vasectomia a partir dos 21 anos.
“Agora com 40 anos tentei fazer a laqueadura e eu não consegui. Lá descobri que como não era mais casada, meu pai tinha que autorizar minha laqueadura. Isso é surreal em pleno século XXI. Alguém precisa me autorizar sobre o meu próprio corpo?”, questiona.
O PL é de extrema relevância e importância, segundo Ana, “e a gente ainda tem um caminho longo sobre autonomia do corpo feminino, mas é um grande avanço e um grande passo para que as mulheres decidam sobre suas vidas. Estou muito feliz com esse avanço, não que ele tenha chegado na melhor hora, mas que bom que chegou, demorou mas chegou”.
O texto mantém o outro critério já previsto em lei: homens e mulheres podem fazer a esterilização em qualquer idade se tiverem, pelo menos, dois filhos vivos.
Se sancionada, a medida passará a valer 180 dias após ser publicada no "Diário Oficial da União". A mudança de regras é uma demanda da bancada feminina e foi aprovada na mesma sessão que comemorou os 16 anos da Lei Maria da Penha.
É uma vitória, mas cesárea desnecessária é problema de saúde
Para Sônia Coelho, integrante da Sempreviva Organização Feminista (SOF) e também da Marcha Mundial de Mulheres (MMM), é uma vitória a mulher ou o homem, no caso da vasectomia, poderem fazer os procedimentos sem autorização, mas lembra que é preciso que todos (as) pacientes precisam ser bem orientados sobre o procedimento que é irreversível. Ela ressalta que o serviço de saúde precisa dizer sobre todos os métodos para não engravidar, para que as mulheres, ou mesmo os homens, no caso da vasectomia, possam escolher a melhor opção.
Sônia também conta que neste projeto também tem uma questão, que é um cavalo de Tróia: fazer laqueadura durante o parto, na cesárea, e isso tem alguns problemas, destaca.
“A mortalidade materna no Brasil ainda é muito alta e a cesárea desnecessária contribui muito para o aumento dos números. O que pode acontecer agora é o aumento do parto cirúrgico, que na verdade só deveria ser feito como necessidade médica. Há uma luta da extrema direita de tornar a cesárea algo opcional porque isso favorece os médicos, quando a Organização Mundial da Saúde diz o contrário. A gente tem que ter muito cuidado com as coisas que estão sendo previstas, porque nem sempre é um benefício para saúde da mulher”, afirma ela, que destaca que o certo é fazer a laqueadura alguns dias depois do parto e não na hora que nasce o bebê e todos os órgãos estão sensíveis.
A lei atual proíbe esse tipo de procedimento durante o parto, exceto em dois casos, quando comprovada a necessidade — se a mulher passou por cesarianas sucessivas anteriores ou se há riscos para a saúde em caso de nova gestação.