Escrito por: CNTE
Direito à educação está comprometido para essa parcela população
Foto: Marcello Casal/ Agência Brasil
Enquanto setores conservadores buscam emplacar a ampliação da militarização das escolas públicas, jovens e adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas são privados do direito à educação.
Publicado em 2023, o Panorama Nacional da Educação no Contexto Socioeducativo mostra que as unidades com jovens internados ou em semiliberdade não conseguem cumprir medidas socioeducativas como estabelece a legislação.
A pesquisa foi realizada pelo Centro Interdisciplinar de Educação Social e Socioeducação (CIESS) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em parceria como Instituto Alana.
O levantamento considerou as ações adotadas entre os anos de 2018 e 2019 pelos estados e comparou com os direitos garantidos pela Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), que regulamenta a execução das medidas socioeducativas para jovens autores de ato infracional.
Após mais de dez anos da promulgação da Lei do Sinase, há poucas informações oficiais sobre a inserção de adolescentes em privação da liberdade na rede escolar e sobre a qualidade do ensino. Mas o Panorama Nacional indica uma realidade muito longe do que foi proposto pelo Sinase.
Números precários
Por meio da Lei de Acesso à Informação, a pesquisa constatou que apenas cinco estados apresentaram taxa de escolarização de 100% para jovens em semiliberdade; para alunos em internação, somente dois estados atingiram o mesmo índice.
Entre as 27 unidades federativas, apenas duas informaram o número de adolescentes cumprindo internação que realizaram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem); e somente 10 indicaram realizar o monitoramento de metas de educação via plano estadual de socioeducação.
Precariedade continua
Pesquisas anteriores já demonstravam um cenário parecido. Em 2012, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) entrevistou cerca de 10% dos jovens em internação no Brasil. Naquela ocasião, 57% dos entrevistados disseram não frequentar a escola antes de ingressar na unidade; 8% disseram ser não alfabetizados; e 86% afirmaram que a última série cursada foi no ensino fundamental.
Segundo o Instituto Alana, parte significativa dos jovens que iniciam o cumprimento da medida socioeducativa em meio fechado já havia interrompido os estudos; e a grande maioria tem defasagem escolar.
O Levantamento Nacional do Sinase de 2017 apontou que 36% dos adolescentes matriculados no contexto socioeducativo de meio fechado cursaram a Educação para Jovens e Adultos (EJA), dentro ou fora das unidades. O Panorama Nacional também revela que somente 15 unidades federativas (55% dos estados) afirmaram oferecer cursos profissionalizantes aos socioeducandos entre 2018 e 2019. Porém, mesmo nesses casos, há situações em que os jovens não frequentam as aulas por conta do baixo efetivo de agentes que não conseguem acompanhá-los nas atividades.
Em relação à oferta de cursos de arte e cultura, no mesmo período, apenas 10 unidades federativas afirmaram oferecer tal modalidade, o equivalente a 37% do total.
Base inexistente e direito desigual
O estudo da Alana aponta para a gravidade da ausência de informações. Há precariedade ou ausência absoluta de informação em 15 dos 21 planos de atendimento socioeducativo estaduais analisados. Apesar de o país contar com leis avançadas de acesso à educação, muitas delas não são implementadas, conforme apontou uma campanha promovida pela Fundação Friedrich Ebert (FES) Brasil a partir de estudos sobre o Plano Nacional de Educação (PNE) por estados, raça, etnia e gênero, do Index do Direito à Educação, de 2021, e da sistematização dos compromissos internacionais do Brasil com a educação.
De acordo com a análise, nos últimos anos, os retrocessos persistiram e há avanços lentos na maioria dos indicadores do PNE, com apenas 5% das metas parcialmente cumpridas.
Segundo o levantamento, os cortes dos governos Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL) impostos à educação, a Emenda Constitucional 95 (teto dos gastos) e os problemas de continuidade de políticas de Estado foram os principais fatores que impactaram no cumprimento dos objetivos.
De acordo com a agente educacional do Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Fundação Casa) de São Paulo Juliana Gonçalves, a falta de responsabilidades dos estados com a educação faz com que os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas sejam punidos duas vezes e impedidos de novas escolhas para o futuro,
Quando o adolescente não se sente acolhido e incluído, ele vai evadir da escola. A ausência das políticas públicas compromete o desenvolvimento do país porque faz com que parte da população jovem ora esteja em medida socioeducativa, ora nas ruas.
Se não há política que tire esse grupo do crime, teremos o tráfico e a criminalidade entregando o que o Estado não entrega com a ausência de políticas públicas e das entidades que fazem fortalecimento de vínculos nos bairros e periferias”, explica.