Escrito por: CNTE
Em 2023, o Brasil comemora 20 anos da Lei 10.639, que alterou a Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional, e estabeleceu a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação Básica. A norma é considerada um marco na educação brasileira, no sentido da transformação social, e caminha junto ao pensamento de uma das lideranças mais importante da história do mundo que combateu o racismo, Nelson Mandela: “a educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo.”
A Lei é resultado da luta do movimento negro e nasceu com o objetivo de levar para as salas de aula mais conhecimento com diretrizes para valorizar e ressaltar a presença africana na sociedade, além de ser um instrumento contra a discriminação e o preconceito racial. As diretrizes estipularam as formas de como as questões étnico-raciais deveriam ser trabalhadas na educação. Uma das orientações foi reconhecer e valorizar as raízes africanas da nação brasileira, ao lado de outras como indígenas, europeias e asiáticas.
Outro ponto que deveria ser explorado é a participação de negros em diferentes áreas do conhecimento, de atuação profissional, de criação tecnológica, artística e de luta social.
Com a abrangência desse dispositivo, a responsabilidade do combate ao racismo nas escolas passou a ser dividida entre diretores de escola, coordenadores pedagógicos, professores, reitores, merendeiras, vigias e outros funcionários, incluindo a comunidade escolar. Segundo Iêda Leal, Secretária de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), ativista integrante do Movimento Negro Unificado (MNU) e agora secretária de Gestão do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, pasta do Ministério da Igualdade Racial no governo Lula, a Lei 10.639 é de grande importância para ensinar à juventude e às crianças uma versão da História que não foi contada da maneira correta, com a recuperação da visão do negro como protagonista dessa narrativa.
“É sabido que houve um processo de invisibilidade dos negros ao longo dos anos, e a Lei traz a possibilidade e a responsabilidade de a escola compreender a importância
de falarmos sobre todos nós de uma forma positiva. Nós temos uma história e uma cultura muito ricas; nosso dever, enquanto trabalhadoras e trabalhadores da Educação, é que essa narrativa seja contada em todos os cantos do país”, afirma.
Desafios e efetivação
Apesar da vitória da implementação da norma, não existem análises públicas recentes para avaliar, oficialmente, a implementação da Lei nos estados brasileiros, nem sua efetividade. Entretanto, há consenso entre trabalhadoras e trabalhadores da Educação quanto a importância de se falar sobre o racismo dentro da sala de aula e que a resistência contra esse tipo de crime é forte dentro do ambiente escolar. De acordo com a supervisora escolar Elisabeth Fernandes de Sousa, a Lei tem sido trabalhada
de forma dialética: em alguns momentos com avanços; em outros, com retrocessos, a depender do momento histórico. Mas, segundo ela, o fato de a norma existir traz
impacto positivo e mobiliza governos a estabelecerem políticas públicas nesse sentido.
“A educação antirracista, desde então, é trabalhada em diversas formas na sala de aula, mas, em geral, por professores negros que tem afinidade com a discussão racial ou
professores brancos com posturas antirracistas com princípio de educar para a Igualdade racial”, afirma. Para Elisabeth, o papel de todos os trabalhadores negros e brancos
é mostrar para a sociedade que é preciso estarmos atentos a outros padrões de afeto, de beleza, de cultura e de participação, além de não pensarmos em seres humanos em
espaços pré-definidos.
Nesse sentido, a Lei 10.639 garantiu a possibilidade de deslocar as pessoas do lugar de objeto, de escravizado, as colocando no lugar de sujeitos detentores de conhecimento, de saberes, de técnicas que contribuíram para a formação da sociedade brasileira. Esse fato mostra o reconhecimento da importância dos povos africanos
e afro-brasileiros para o Brasil e, consequentemente, atua diretamente no combate ao racismo.
Mesmo durante os últimos anos de negação ao racismo promovido pelo governo Bolsonaro, a luta antirracista sobreviveu e resistiu. “Nós temos uma produção intelectual
grandiosa; precisamos continuar repartido essa produção com todas as pessoas da educação, já que se trata de uma grande parceira no compromisso com a luta antirracista”,
concluiu Elisabeth.
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