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Artigo - Violência contra as mulheres: um olhar sobre os números e a vida.

Publicado: 02 Março, 2022 - 18h07

Escrito por: CNTE

A violência na pandemia

A chegada da Covid-19, uma pandemia que se alastrou por todos os continentes, transformou o cotidiano de milhões de pessoas no mundo e atingiu com maior gravidade, as pessoas pobres e vulneráveis, especialmente as mulheres, que representam o grupo social mais afetado pelos impactos dessa grave crise sanitária.

O relatório Mulheres no centro da luta contra a crise Covid-19, produzido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado em março de 2020 pela ONU Mulheres já mostrava alguns indicativos que poderiam ser agravados com os efeitos sociais e econômicos da pandemia no Brasil.

Conforme o relatório, as mulheres representam quase 70% da força de trabalho da saúde. No Brasil, 85% dos cargos da área de enfermagem e mais de 45% da área médica, além de 85% da dos cuidadores de idosos, são ocupados por pessoas do sexo feminino. Pelo fato de ocuparem a maior parte da linha de frente dos trabalhos de prevenção e tratamento da enfermidade, estas estão mais expostas aos riscos de infecção e doenças psicológicas decorrentes do stress.

O estudo ainda aponta que, aliado a essas questões, existe o fato que, com o isolamento, os índices de violência doméstica aumentaram consideravelmente no mundo. Com as restrições aplicadas a vários serviços de atendimento ao público durante a pandemia, as mulheres passaram a ter mais dificuldades de acesso às redes de proteção e aos canais de denúncia, o que prejudicou o levantamento real dos dados e o devido acompanhamento aos demais tipos de violência contra as mulheres, exceto o feminicídio.

A pandemia desencadeou alterações bruscas na vida das famílias e da sociedade em geral. As restrições nos deslocamentos, perturbam a rotina de modo geral, adicionando tensionamento e estresse. As crianças, em geral, estão fora da rotina escolar/creche, com acesso restrito a atividades de grupo e esportes. Homens e mulheres estão em trabalho remoto, o que também implica em sobrecarga, desafios na conciliação de rotinas da casa e com cuidados com crianças e outros membros da família. (FIOCRUZ, p. 2, 2020).

Portanto, a realidade imposta às mulheres pelo isolamento social, desencadeou o convívio prolongado com seus “parceiros” dentro de casa, representando um risco, especialmente em um contexto em que as preocupações e inseguranças trazidas pela pandemia elevam as tensões e os conflitos familiares e aumento de casos de violência de gênero.

Como a maior parte dos crimes cometidos contra as mulheres no âmbito doméstico exigem a presença da vítima para a instauração de um inquérito, as denúncias começaram a cair na quarentena em função das medidas que exigem o distanciamento social e a maior permanência em casa. Além disso, a presença mais intensa do agressor nos lares constrange a mulher a realizar uma ligação telefônica ou mesmo de dirigir-se às autoridades competentes para comunicar o ocorrido. (Anuário de Segurança Pública, p.38, 2020)

Tal contexto explica que a diminuição do registro de ocorrências não representa a redução de casos de violência contra a mulher e sim as dificuldades e obstáculos que essas encontraram na pandemia para denunciar.
Em uma comparação entre 83 países, o Brasil possui uma taxa média de 4,8 assassinatos a cada 100 mil mulheres – 2,4 vezes maior que a taxa mundial, o que significa 02 assassinatos a cada 100 mil mulheres, ocupando assim o 5º lugar no ranking mundial de feminicídios.

Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020, os homicídios dolosos de mulheres e os feminicídios tiveram um crescimento de 2% no primeiro semestre de 2020. Em números absolutos, 1.350 mulheres foram assassinadas por sua condição de gênero, ou seja, morreram pelo fato de serem mulheres. No total, foram 3.913 registros de mulheres assassinadas no país no ano passado (2021).

A eliminação da violência contra a mulher, bem como o fim do feminicídio dependem do conjunto da sociedade e de políticas intersetoriais de Estado. É urgente inaugurar novas formas de enfrentar esse problema que deve interessar a toda sociedade. É fundamental o desenvolvimento de ações institucionais por parte de governos que compreendam a vulnerabilidade social e econômica das meninas e mulheres, considerando as suas diferentes dimensões, étnicas, de raça e classe, que convivem diariamente com situações de perigo e violência e tem suas vidas ameaçadas por sistemas econômicos capitalistas, patriarcais, racistas e misóginos.

Onde procurar ajuda:

• Ligue 180: disque-denúncia. Funciona 24 horas, todos os dias, e pode ser acionado em qualquer lugar do Brasil. É possível fazer a denúncia de forma anônima.

• Polícia Militar: 190 – serviço de urgência/emergência às mulheres em situação de risco.

• Delegacias de Mulheres nos Estados.

• Centros de Atendimento às Mulheres nos Estados.

Eloisa Castro Berro
Assistente Social, Mestre em Serviço Social pela UNESP/UCDB. Professora Universitária. Coordenadora responsável pela implantação da Casa da Mulher Brasileira de Campo Grande/MS. 2015/16. Militante do Movimento Popular de Mulheres.

Manuela Nicodemos
Comunicóloga, Mestre em Sociologia pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Pesquisadora Social e ativista da Marcha Mundial de Mulheres

>> Acesse o arquivo digital (em PDF) da revista Mátria 2022