Políticas Públicas para as Mulheres no Brasil – Avanços, retrocessos e resgates
Leia o encarte teórico produzido pela socióloga Eline Jonas para a Revista Mátria
Publicado: 11 Março, 2025 - 07h52
Escrito por: Eline Jonas | Editado por: Eline Jonas
Artigo escrito por Eline Jonas para a Revista Mátria. Eline é socióloga, doutora em Ciências Políticas e Sociologia, professora aposentada da PUC-GO, ex-presidenta da União Brasileira de Mulheres/UBM, Políticas Públicas para as Mulheres e diretora da UBM/DF.
1.Breve recorrido para identificar as Conquistas por direitos e Políticas Públicas para as mulheres
Há 115 anos da instituição do dia 8 de março, dia Internacional da Mulher; 50 anos da 1ª.Conferência Mundial sobre a Mulher no México; 30 anos da Declaração e Plataforma de Ação de Beijing; 25 anos da adoção da Resolução 1325 do Conselho de Seguridade da ONU sobre Mulheres, Paz e Seguridade e 10 anos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e ODS(Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) , vivemos sob o impacto de crises econômicas, guerras imperialistas genocidas que matam mulheres e crianças, das questões climáticas e desastres naturais e também do crescimento do conservadorismo que impactam fortemente a vida e de todo o povo no resto do mundo, em especial, das mulheres que ainda enfrentam a desigualdade, a violência, a exclusão social e a invisibilidade.
As crises política, econômica e financeira no mundo atingem de maneira particular as mulheres e se agrava desde as “desigualdades cruzadas”, quer dizer quando as mulheres sofrem dupla ou tripla discriminação de raça/etnia, classe social, gênero, especialmente em relação às mulheres do campo, negras e indígenas, grupo contraposto ao das mulheres urbanas, principalmente nas sociedades menos desenvolvidas, dependentes e mais vulneráveis diante das potencias imperialistas, hoje (ultra)neoliberais.
A situação e as necessidades das mulheres são muito semelhantes em todo o mundo, condicionadas pela estrutura patriarcal, sejam islâmicas, cristãs, ocidentais ou orientais, estão sensíveis ao apelo social “naturalizado” de papéis sociais definidos junto à família e aos cuidados. São fortes a pressão e o controle dos valores morais culturais e religiosos que, em geral, desestimulam a presença nos espaços públicos e não as valorizam fora do espaço doméstico - conforme o tempo histórico, a cultura e a estrutura de poder da região.
Sendo reconhecida a desigualdade de gênero no mundo e o pouco conhecimento sobre a vida das mulheres, a Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu a primeira década dedicada às mulheres (1976-1985) na Conferência Mundial sobre a Mulher (1975) com o objetivo de coletar dados acerca da situação das mulheres globalmente.
Em 1995, na 4ª. Conferência Internacional em Beijing (1995), participaram 181 nações, para avaliar e promover os direitos das mulheres em nível mundial, além de definir um plano de ação para a igualdade de gênero em vários setores, como saúde, educação, trabalho e participação política. Deu origem à Declaração e Plataforma de Ação de Beijing, importante na luta pelos direitos das mulheres.
O Plano de Ação de Beijing, 1995 estabeleceu 12 áreas prioritárias para orientar as ações de governos e entidades nas próximas décadas para combater as desigualdades e fortalecer os direitos das mulheres com prioridade global a Educação e Capacitação, Saúde e Direitos reprodutivos, Combate à Violência Contra as Mulheres, Participação Política e Econômica, Reconhecimento do Trabalho Não Remunerado, Autonomia Jurídica e Patrimonial, Promoção da Igualdade de Gênero na Cultura e Mídia. (CEPIA,2001 e ONU Mulheres,2013).
O Brasil, como signatário das Convenções Internacionais aprovadas nos eventos da ONU, incluiu na agenda Nacional a elaboração de Políticas Públicas para as mulheres.
Para identificarmos as políticas para os direitos das mulheres, conquistados desde o Séc. XX até a formulação de Políticas Públicas para as Mulheres no Brasil, deve se considerar aspectos da história de lutas das mulheres e suas conquistas antes e desde as Conferências, os Acordos e Pactos Internacionais sobre as mulheres, especialmente desde a 4ª. Conferência de Beijing (1995) e avaliações dos progressos e fragilidades em Beijing + 5 ; Beijing +10 ; Beijing +15; Beijing +20 e Beijing +25, e, segundo Relatórios da ONU Mulheres, observando aspectos sociais, institucionais conjunturais, período histórico e Projetos Políticos de Poder, orientadores das ações governamentais.
1.1. Brasil: Lutas de resistência e Direitos conquistados por e para as Mulheres. As Políticas Públicas para as Mulheres pós Conferência de Beijing (1995)
Ao longo da história republicana do Brasil, as mulheres alcançaram o direito ao ensino fundamental (1827), ao ensino superior (1879), ao voto (1932), entre outras vitórias. No contexto político, em 1927, o Rio Grande do Norte se torna o primeiro estado a permitir o voto feminino e, em 1928, uma mulher é eleita para um cargo eletivo. Em 1932, o sufrágio se torna universal, embora com limitações. A primeira deputada federal foi eleita em 1933. Em 1934, as limitações ao voto feminino, que não é obrigatório, são eliminadas. O voto feminino se torna obrigatório em 1946. A primeira ministra de estado para a Educação é nomeada em 1982. No ano de 1979, a primeira mulher assume a posição de senadora suplente. Em 1990, foram eleitas as primeiras mulheres senadoras e já haviam deputadas federais. Em 1994 foi eleita a primeira governadora e em 2010 foi eleita a 1ª. Presidenta da República, reeleita em 2014. (SARDÁ,2024)
Nos anos 1970-2000 houve uma forte mobilização popular, de feministas e de mulheres- luta contra a Ditadura (1964), a Carestia, pela Anistia (1979), por Eleições Diretas (1984) e pela Constituinte (1988) -forte pressão social e política aos governos da ditadura, por liberdade, democracia e pós eleições de 1985 (Colégio Eleitoral) por direitos das mulheres e criação de órgão estruturado para as questões específicas.
Não existia uma entidade dedicada às políticas para as mulheres, mas sim estruturas fragmentadas e restritas, como o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM -1985), vinculado ao Ministério da Justiça, um órgão consultivo encarregado de elaborar políticas e fomentar ações focadas na igualdade de gênero e na proteção dos direitos das mulheres.
Nos anos 1990, algumas Secretarias e Departamentos em Ministérios Federais tratavam das questões de gênero, sem autonomia, com pouco orçamento e atuação limitada, subordinados a outras pastas -Justiça ou Direitos Humanos. No período, as Conferências sobre as Mulheres em Nairóbi, 1985 e Beijing, 1995, influenciaram nas discussões sobre a institucionalização de políticas de gênero no Brasil. Foi um avanço civilizatório como afirma (Araújo, 2002),
as lutas e conquistas de direitos políticos e sociais experimentadas ao longo do sec. XX permitiram o estatuto da cidadania plena [...] com exceção em países que o fundamentalismo religioso se mescla com o Estado.
O Brasil desempenhou um papel ativo na Conferência de Beijing, implementando várias políticas públicas em conformidade com a Declaração e Plataforma de Ação em momento de intensa agenda feminista para implementação da igualdade de gênero nas políticas governamentais. E o marco institucional para essas políticas foi a criação da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), 2003.
Desde a Plataforma de Ação de Beijing (1995) foram estabelecidas no Brasil: a Política Nacional para as Mulheres, a Secretaria de Políticas para as Mulheres, campanhas contra a Violência Doméstica, a Lei Maria da Penha, Lei do Feminicídio, a participação política das mulheres, o acesso à saúde reprodutiva, políticas de educação e capacitação para mulheres e jovens, além de políticas de empoderamento econômico.
Em 2020, o Brasil participou da avaliação global de Beijing+25, que estabeleceu orientações para promover a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres. Além disso, identificou progressos e desafios constantes em nossas políticas, de 1995 a 2020. (CEPAL). Foi concluído que, apesar dos avanços no Brasil na promoção dos direitos das mulheres, ainda existem desafios devido aos altos índices de violência de gênero e feminicídio, à desigualdade econômica e à pequena participação política das mulheres. Isso demanda novas estratégias e ações mais efetivas para alcançar a plena igualdade de gênero no país.
2.O Contexto da ruptura das Políticas Públicas implementadas para as mulheres – uma agressão à democracia, mas esqueceram que não estamos sós!
No Brasil desde 2013 houve um crescente movimento de desestabilização política com ataques à Democracia e às Instituições oficiais com notícias falsas e desinformações -ações fascistas, misóginas e racistas com forte tom de ódio às mulheres, negros, pobres e indígenas, contra o Estado Democrático de Direito e aos avanços rumo a emancipação e soberania nacional.
Esses movimentos foram a base para o golpe político institucional que destituiu a Presidenta Dilma/ (Mais Mudança, Mais Futuro) em 2015, com final do mandato por Michel Temer/Uma Ponte para o Futuro (vice-presidente apoiador do golpe- 2016-2017) e a eleição de Bolsonaro/ Pátria Amada, Brasil (2018 a 2022), projeto privatista, antinacional e anti-ciência, defensor do Estado Mínimo e de redução das Políticas Sociais e privatização da saúde, de empresas públicas, estratégicas para a soberania nacional, militarização da educação, além de subsídios e plena liberdade para seus negócios, em detrimento dos interesses sociais- moradia, educação, saúde, cultura e trabalho decente.
Promoveram ações para o desmonte do Estado Democrático de Direito culminando na tentativa de golpe (rechaçada), em 8 de janeiro/2023 para impedir a posse do Governo Lula/Projeto Democrático Popular, eleito com apoio das mulheres e dos setores progressistas.
O Governo Bolsonaro, com foco na redução do Estado, definiu suas prioridades de governo - cortes nas políticas públicas, reduziu direitos, fez ajustes fiscais, reforma da previdência, trabalhista e privatizações. Descontinuou políticas públicas em andamento, afetando os mais vulneráveis, principalmente as mulheres, pelo desemprego, precarização no trabalho e pelo negligenciamento da saúde pública (ações anti-vacina), inclusive na Pandemia da COVID 19- frente a 700.00 vidas interrompidas, além da profunda pauperização da população com a crise gerada.
No campo ideológico, promoveu ações midiáticas disseminando notícias falsas, valores tradicionais e desqualificando a presença das mulheres nos espaços públicos e nas demandas por acesso a saúde, educação em gênero e valorização profissional, insuflando o racismo, o menosprezo e o ódio às mulheres, à população pobre, negra e à população LGBTQI+.
Uma situação de crise forjada e de retrocesso político que nos lembra a observação de Beauvoir (1949:1980): “nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados” – registra a necessidade de vigilância constante para garantir a democracia, igualdade de direitos e oportunidades, especialmente em tempos de instabilidade política e social.
2.1. Retrocessos: descontinuação das políticas públicas para as mulheres no Governo Bolsonaro: 2019 a 2022
Durante os anos de 2016 a 2022, o Brasil enfrentou um período de retrocessos sob governo Bolsonaro. Os cortes orçamentários, as reestruturações institucionais e as novas prioridades governamentais tiveram um forte impacto nos direitos e na segurança das mulheres. Programas fundamentais perderam recursos ou foram encerrados, comprometendo políticas públicas em execução e conquistas anteriores.
A política de Governo, afetou ações fundamentais para as mulheres nas áreas da violência de gênero, empoderamento econômico, saúde reprodutiva, educação e participação política. Desativou programas voltados para a participação da sociedade civil, movimentos sociais e grupos marginalizados nas decisões sobre as políticas reduzindo a participação social nestas áreas e impactando na vida das mulheres em situação de vulnerabilidade e no avanço em direitos para a igualdade. Pois,
não pode haver perspectiva de igualdade quando o governo brasileiro se torna o principal propulsor das políticas neoliberais (ultraneoliberais) no país, reduzindo investimentos públicos [...] coloca em risco direitos conquistados nos últimos anos” (JONAS,2004).
A descontinuação da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) trouxe prejuízos inviabilizando a articulação das ações entre os diferentes Ministérios no que se refere a intersetorialidade principalmente nas ações voltadas para a educação, saúde e violência. E a redução do foco político nas questões de gênero foi uma constante, afetando principalmente as mulheres negras, indígenas e população LGBTQI+. Impactou no “Programa Mulher, viver sem Violência”- as mulheres perderam a referência da proteção do Estado com a redução do acolhimento, mesmo quando houve o aumento da violência e dos feminicídios, deixando marcas físicas e psicológicas profundas nas mulheres vítimas de violência e famílias, contrariando o que se espera como disse Kollontai (1918: 2000, p.46-47): “sair dos conflitos do amor, não com as asas quebradas e sim como saem os homens, com a alma fortalecida”.
As políticas de inclusão das mulheres no mercado de trabalho foram enfraquecidas pelos Programas de Empoderamento Econômico que foram interrompidos, uma situação que demandaria o suporte do Estado para os mais vulneráveis no momento em que havia 12.000.000 de desempregados no país.
As Políticas de saúde reprodutiva foram prejudicadas, especialmente no acesso ao aborto legal, aos cuidados de saúde sexual e reprodutiva e aos programas de planejamento familiar, fundamentais para a saúde da mulher e vítimas de estupro que engravidaram, além da interrupção das campanhas de prevenção do câncer ginecológico, gravidez precoce e doenças sexualmente transmissíveis. Ações que afetaram a autonomia das mulheres no direito de decidir sobre a vida reprodutiva e o direito à saúde integral e universal.
A educação em escolas públicas nas regiões carentes foi inviabilizada pela interrupção do Programa Mais Educação, (PME), e pela despriorização do ProJovem, ProUni, Fundeb, ProInfo, Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), Programa de Valorização dos Profissionais da Educação (PVE). Os cortes impediram o acesso pleno à educação superior e benefícios para a inclusão (Programas de Educação para a Igualdade de Gênero e a formação de professores para as questões de gênero e diversidade sexual no combate ao bullying), além dos Programas de Cotas para mulheres e minorias.
E, por fim, a forma de afastar a sociedade civil do debate e decisões políticas foi enfraquecer os Conselhos e Fóruns de participação social com representação da sociedade civil e dos movimentos sociais (Conselhos de Direitos Humanos e de Políticas Públicas, Fórum Nacional de Participação Social), o Programa de ações afirmativas, a redução de políticas de participação da juventude e de Políticas de Acesso à Informação e Transparência.
O desmantelamento dessas Políticas Públicas foi observado, criticado e rejeitado pelos movimentos sociais, feministas e de mulheres, uma vez que afetou diretamente todos os aspectos dos Direitos Humanos das mulheres, diminuindo as oportunidades de se empoderar para sua emancipação e progresso na sociedade.
3.O resgate das Políticas Públicas, Programas e Ações para as Mulheres
3º Governo Lula: 2023 a 2026
Desde 2023, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, reitera seu compromisso com os acordos internacionais, abandonados pelo governo Jair Bolsonaro e os incorpora ao seu Programa de Governo aberto às demandas sociais e às pautas emancipatórias trazidas pelo movimento de mulheres, sindicatos e movimentos sociais.
Nas políticas implementadas, destaca-se a formação dos Conselhos de representação da sociedade civil em vários Ministérios, a criação do Ministério das Mulheres para coordenar e aplicar políticas públicas de igualdade de gênero além do Ministério dos Povos Indígenas, cuja Ministra indígena está focada nas necessidades dos povos originários.
As políticas públicas novas direcionam atenção especial às mulheres em condições vulneráveis e são coordenadas entre os Ministérios que abrangem áreas desde saúde pública e direitos reprodutivos até educação e combate à violência - com enfoque em região e populações fragilizadas.
E, a mais nova delas foi a Política Nacional de Cuidados (dezembro de 2024) que impactará na vida e saúde das mulheres deste trabalho invisível e essencial. Ao ser reconhecida a sua relevância para quem mais precisa de cuidado e apoio, reconhece e valoriza o trabalho das que cuidam (mulheres, familiares ou as mais pobres e negras). O trabalho de cuidado será valorizado por meio dos serviços públicos, expandindo creches, escolas de tempo integral e programas de suporte para Pessoas Idosas e com Deficiência.
Os Programas sociais e de educação e novas políticas públicas, são articuladas entre Ministérios responsáveis pelas áreas de saúde, direitos reprodutivos, educação, luta contra violência, cultura, ciência e tecnologia, participação política e poder voltados para as regiões e pessoas mais vulneráveis. E, todas as políticas incluem ações para as mulheres em situação de vulnerabilidade (indígenas, negras, quilombolas e pessoas LGBTQIA+) para assegurar o acesso à saúde reprodutiva para todas as pessoas com útero, incluindo homens trans e pessoas não-binárias.
As Políticas, Programas e Campanhas interministeriais para a inclusão das mulheres, tanto do campo como da cidade, resgatam e fortalecem as ações afirmativas, as cotas na educação e em concursos públicos, contemplando as mulheres negras, indígenas, quilombolas e jovens vulneráveis.
A inclusão social das mulheres na política e as medidas para esse empoderamento perpassam todo o projeto político com ações e apoio à participação política das mulheres e para o acesso às esferas de poder com a Cartilha “Mais Mulheres no Poder, Mais Democracia”. Para tanto, prioriza programas e ações na Educação, enfrentamento a Violência, Saúde, autonomia econômica e combate a desinformação.
As ações para o acesso igualitário à educação incluem investimentos para evitar a evasão escolar e fortalecer a formação de professores e a capacitação profissional continuada, bem como bolsas de estudos para negras e indígenas e incentivos para inclusão no mercado de trabalho como oportunidade de realização cidadã.
O combate a violência está entre as prioridades com estratégias para prevenir a discriminação, a misoginia e todo tipo de violência contra mulheres e meninas. O Programa Mulher Viver sem Violência e o Pacto Nacional de Prevenção ao Feminicídio com investimentos nas Delegacias de Mulheres e para instalação das Casa da Mulher Brasileira nos Estados proporciona o acolhimento, apoio psicossocial, alojamento e capacitação profissional para autonomia financeira.
Considerando que a violência é uma questão de saúde pública, cabe ressaltar que apesar dos avanços, a reação de setores conservadores e fundamentalistas tem impedido a plena implementação dos serviços para o aborto legal. Defendem princípios religiosos contrariando os avanços do próprio sistema de saúde e da ciência no Estado laico.
Em Saúde e Direitos Reprodutivos e Direitos Sexuais, promove-se o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) com Políticas, que expandem o acesso à saúde e a educação sexual nas escolas com foco nas relações de gênero.
A Política Nacional de Saúde Integral LGBT, retomou a qualificação e o credenciamento dos serviços relacionados ao processo transexualizador, desde o acolhimento e uso do nome social no SUS até as cirurgias de redesignação sexual. Também merece destaque o pré-natal e a educação sexual nas escolas focando as relações de gênero.
O Planejamento Reprodutivo foi fortalecido pela reestruturação do planejamento familiar por meio de informação, serviços e monitoramento da saúde integral reafirmando o direito ao aborto nos casos previstos em lei no Brasil - gravidez por violência sexual, risco de vida para a mulher e anencefalia fetal.
No Congresso Nacional, investem contra a vida das mulheres (PEC 164/2012) que retira o direito de interromper a gestação de meninas em situação de violência e mulheres (estupro) ou no caso de gravidez com risco de vida e do feto anencéfalo. O projeto fere os direitos Legais e Constitucionais – “a dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável”, segundo Zanotta (2024), quando impõe uma gestação por estupro, desconhecendo a realidade social e desrespeitando o direito de decidir das mulheres.
Se aprovada, a PEC violará direitos fundamentais das mulheres e colocará em risco a vida, pela gestação forçada, de meninas violentadas como também, impedirá o avanço da ciência, portanto, caminha na direção contrária aos Direitos Humanos das Mulheres. Impedirá também a pesquisa científica e procedimentos já existentes - técnicas de reprodução assistida, especialmente a técnica de fertilização in vitro e pesquisa com células tronco.
A realidade exige urgente enfrentamento aos setores conservadores que barram os avanços emancipatórios para as mulheres para consolidar a democracia e a retomada efetiva dos serviços de atenção a crianças, adolescentes e mulheres em situação de violência, o fortalecendo d políticas públicas de saúde com medidas integradas e ampliar a inserção das mulheres na vida política do país.
Considerações Finais
Embora tenha havido progressos recentes na consolidação da frágil democracia do Brasil e na recuperação das políticas públicas abandonadas pelo projeto privatista do Governo Bolsonaro, tem sido lenta a evolução dos direitos das mulheres no árduo percurso pela igualdade de gênero e contra todo tipo de discriminação e preconceitos.
Continua a existir discriminação e a aumentar o feminicídio e a violência contra as mulheres, com um componente cultural misógino, racista e de ódio que afetam de maneira mais significativa as mulheres negras, pobres e a comunidade LGBTQI+, demandando uma maior intervenção do governo.
O desafio para governo brasileiro, de compromisso popular, no Estado Democrático de Direito, está em garantir os direitos humanos, em especial, das mulheres com Políticas Públicas fortalecidas e com ações mais eficazes para superar as desigualdades no acesso ao trabalho; a desigualdade salarial; a pouca presença das mulheres na representação política e nos espaços de poder; a falta de serviços sociais e equipamentos públicos em horários especiais (creches); erradicar as mortes maternas evitáveis que, apesar da redução, ainda tem altas taxas, penalizando as mulheres negras e pobres; enfrentar com efetividade a violência política, doméstica e o feminicídio; garantir os direitos reprodutivos e direitos sexuais e o pleno acesso ao trabalho decente; fortalecer a educação reforçando a consciência sobre a igualdade de gênero e o respeito às diferenças.
Enfim, dar efetividade às políticas retomadas como Políticas de Estado promovendo oportunidades às mulheres de todas as idades e origens para reduzir as disparidades existentes rumo a uma sociedade de justiça social.
Cabe às mulheres brasileiras continuarem unidas às forças progressistas na histórica jornada de vigilância e lutas por direitos, com radicalidade, contra qualquer retrocesso, para romper com os elos das estruturas e cultura patriarcais, de exploração de classe e de opressão de gênero que impedem o avanço rumo a sua emancipação política e a emancipação humana. Vem...
[...] Vem… simplesmente, vem… comigo
junto com quem está a construir
aquele novo mundo que sonhamos! [...]
(Cony, Jussara,2012)
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