VIII Conferência Nacional Paulo Freire: Currículo e avaliação nos sistemas escolares
Texto de subsídio ao debate. Dia 19/09, 14 horas, mesa de debate com:Miguel Arroyo - Cientista Social, PHD em Educação- Professor de Pós-Graduação Lato Sensu da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e Professor Titular do Instituto Superior de Estudos Pedagógicos.Rubens Barbosa de Camargo - Professor Doutor da Universidade de São Paulo.Currículo e avaliaçã...
Publicado: 19 Setembro, 2012 - 16h34
Escrito por: CNTE

Texto de subsídio ao debate.
Dia 19/09, 14 horas, mesa de debate com:
Miguel Arroyo - Cientista Social, PHD em Educação- Professor de Pós-Graduação Lato Sensu da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e Professor Titular do Instituto Superior de Estudos Pedagógicos.
Rubens Barbosa de Camargo - Professor Doutor da Universidade de São Paulo.
Currículo e avaliação nos sistemas escolares
Uma das heranças mais marcantes, cruéis e subliminares do neoliberalismo na educação – além da negação do direito à educação pública, gratuita, democrática e de boa qualidade – consiste na imposição de um currículo escolar voltado exclusivamente aos interesses do capital em formar mão de obra barata e acrítica Reproduzem-se princípios da qualidade total (empresarial) sob o argumento da eficiência na aprendizagem e na gestão pública escolar e dos sistemas de ensino, desconsiderando por completo a identidade cultural e as inúmeras interfaces da educação no processo de formação para a cidadania e a paz social.
O Brasil, embora tenha avançado na perspectiva do direito à educação – e a Emenda Constitucional nº 59 situa nosso país em um patamar avançado de provimento escolar público gratuito (pré-escola ao ensino médio) –, ainda não conseguiu mudar a matriz curricular neoliberal, fortemente alicerçada nos testes padronizados que sustentam o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB).
As competências pedagógicas têm anulado o currículo crítico e inovador, não obstante a Constituição Federal zelar, em capítulo especialmente destinado à educação, pela liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber (..) e pelo pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas. Já a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em seu art. 12, indica que os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: I - elaborar e executar sua proposta pedagógica; II - administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros; III - assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecida, IV - velar pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente, dentre outras orientações.
Ocorre que, além de não respeitar a autonomia escolar, os sistemas de ensino têm submetido o currículo escolar estritamente às avaliações estandardizadas, ditadas pelo atual sistema nacional de avaliação, que insiste em ter fim em si mesmo, o que é um equívoco de graves consequências.
A questão central a ser discutida é que não basta dar educação, é preciso saber qual educação o país necessita para promover a inclusão e o desenvolvimento com bem estar social. Concomitantemente, é preciso garantir as condições para que o currículo se desenvolva nas escolas, observando-se o princípio democrático de elaboração dos projetos educacionais do sistema e das escolas, a valorização dos profissionais e a gestão democrática.
Neste sentido, a CNTE entende que a gestão democrática é parte decisiva para a implementação de uma proposta curricular de base social, a qual não poderá ser alcançada sem que os profissionais da educação tenham o direito à formação inicial e continuada que os possibilitem a trabalhar as relações da escola com sua comunidade e a manter em sintonia as diretrizes curriculares emanadas pelo Conselho Nacional de Educação – referência máxima do currículo da educação básica – com o projeto político pedagógico da escola.
Na esteira da democratização da gestão educacional, os conselhos de educação (nacional, estadual, distrital e municipal) devem contar com a presença de todos os atores escolares (profissionais, estudantes, pais e gestores), assim como os conselhos escolares e outros fóruns democráticos da escola precisam participar do processo de construção do projeto pedagógico escolar.
Quanto às diretrizes curriculares do CNE, nos últimos anos, com muito atraso, passou-se a investir no debate social sobre a reformulação das orientações neoliberais que ainda ditam a execução curricular nos sistemas de ensino do país. O problema é que a estrutura das escolas, a forma de gestão dos sistemas, os cursos de formação profissional e o sistema nacional de avaliação escolar continuam a caminhar em sentidos opostos aos princípios emancipadores que sustentam a maior parte das novas diretrizes. E isso impede o avanço de novas concepções pedagógicas, principalmente aquelas que visam apartar as orientações neoliberais de aprendizagem por competências.
O currículo mínimo, plataforma central das competências, foi derrotado recentemente no Congresso Nacional, mesmo tendo sido aprovado na Câmara dos Deputados, por meio de forte pressão da CNTE e de seus sindicatos filiados. O projeto previa fixar conteúdos mínimos para cada ano/série do ensino fundamental e médio, desconsiderando a autonomia escolar e a orientação multidisciplinar das diretrizes do CNE.
No entanto, o Plano Nacional de Educação contém estratégias prevendo a elaboração pelo MEC e pelo Conselho Nacional de Educação – consultada a sociedade – de propostas de "direitos e objetivos de aprendizagem" para os estudantes do ensino fundamental e médio. Trata-se de tema polêmico, com inúmeros significados, razão pela a comunidade educacional deve participar do debate no sentido de refutar as teses das competências, reivindicando a democratização e a emancipação do currículo escolar.
A disputa entre concepções curriculares é algo latente nas políticas de governos, em todo país, estando neste momento presente na educação técnica-profissional, desde o lançamento do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e ao Emprego. O PRONATEC, lançado pelo Governo Federal e aprovado no Congresso, desconsidera o Decreto 5.154, amplamente debatido com a sociedade, e reforça a lógica neoliberal na formação profissional dos/as trabalhadores/as. Mesmo compreendendo a necessidade do país em suprir a falta de qualificação profissional para prosseguir com o processo de desenvolvimento, não se deve admitir que recursos públicos sejam destinados a projetos educacionais, da iniciativa privada, com foco numa educação despolitizada que desconsidera a formação humanística da classe trabalhadora.
Com relação à avaliação, a CNTE entende tratar-se de uma política estruturante do sistema educacional, devendo, todavia, ser processual, qualitativa e de caráter sistêmico e democrático, a fim de tornar-se um instrumento de aperfeiçoamento do processo educacional.
Neste sentido, é imperioso reafirmar a posição do PNE da Sociedade Brasileira (1997), no sentido de que a avaliação interna e externa das instituições educacionais deve levar em conta os seus recursos, sua organização, suas condições de trabalho, o padrão único de qualidade e, no caso da educação superior, a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, visando alcançar resultados socialmente significativos.
No que tange aos profissionais da educação, o inciso IV do artigo 67 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional determina que os sistemas de ensino devam promover a valorização dos profissionais da educação assegurando-lhes, nos estatutos e planos de carreira, progressão funcional baseada na avaliação do desempenho. Portanto, a legislação trata da avaliação do desempenho na perspectiva de garantir a progressão funcional como forma de valorizar os docentes.
A Resolução nº 2/2009, do Conselho Nacional de Educação, que rege os princípios e as diretrizes da carreira do magistério público, apresenta a avaliação de desempenho dos docentes como parte dos incentivos de progressão na carreira, com base em ações objetivas centradas na escolha de requisitos que possibilitem a análise de indicadores qualitativos e quantitativos e a transparência, assegurando que o resultado da avaliação possa ser analisado pelo avaliado e pelos avaliadores com a finalidade de superar as dificuldades detectadas para o desempenho profissional ou do sistema.
Afirma ainda, a referida Resolução, que a avaliação de desempenho deve reconhecer a interdependência entre trabalho do profissional do magistério e o funcionamento geral do sistema de ensino, e, portanto, ser compreendida como um processo global e permanente de análise de atividades, a fim de proporcionar ao profissional do magistério um momento de aprofundar a análise de sua prática, percebendo seus pontos positivos e visualizando caminhos para a superação de suas dificuldades, possibilitando, dessa forma, seu crescimento profissional e, ao sistema de ensino, indicadores que permitam o aprimoramento do processo educativo.
O projeto de lei n. 8.035/2010 de autoria do poder executivo federal, que tramita no congresso nacional, no seu artigo 11 trata do sistema nacional de avaliação da educação básica como fonte de informação para avaliar a qualidade da educação básica e para orientar as políticas públicas necessárias. Este sistema deverá produzir indicadores de rendimento escolar referentes ao desempenho dos estudantes, e indicadores de avaliação institucional relativos a características como o perfil do alunado e do corpo de profissionais da educação, as relações entre dimensão do corpo docente, do corpo técnico e do corpo discente, a infraestrutura das escolas, os recursos pedagógicos disponíveis e os processos de gestão, entre outras relevantes.
Tanto na legislação vigente quanto no projeto de PNE, a avaliação tem sido tratada como elemento motivador para a melhoria da qualidade da educação, de forma diagnóstica, para incentivar a progressão dos profissionais da educação e orientar as políticas públicas educacionais na perspectiva de melhor atender a população brasileira, o que dialoga com a defesa do movimento sindical.
A CNTE entende que a avaliação diagnóstica e incentivadora do desempenho profissional é um contraponto às propostas gerenciais de meritocracia, caracterizada pela busca desesperada por resultados no IDEB, e que faz com que os sistemas de ensino apliquem medidas que mais atrapalham do que ajudam no desempenho da educação básica, tais como: impor o currículo único para toda rede, desconsiderando as realidades de cada microrregião dos estados brasileiros; transferir professores de uma escola para outra de forma autoritária (transferência ex-ofício, muito utilizada no tempo da ditadura militar); burocratizar os registros de frequência e das aulas ministradas; fiscalizar a dinâmica do/a professor/a na sala de aula, com o argumento de que se dedica pouco tempo para os conteúdos pedagógicos; pagar bônus pela proficiência dos estudantes, desconsiderando as condições de trabalho dos docentes e as condições socioeducacionais dos estudantes, dentre outras medidas consideradas verdadeiras aberrações pelos profissionais da educação.