Violência - Na luta por direitos e contra a violência
Publicado: 01 Março, 2021 - 12h37
Escrito por: CNTE
Em casa ou na política, elas convivem com agressões e têm sua existência ameaçada
E m um ano marcado por uma pandemia, muitas mulheres se depararam com ainda mais uma ameaça: a violência contra elas. Com a necessidade do distanciamento social, muitas ficaram presas em casa com os seus agressores. O resultado foi o aumento de casos de violência doméstica no período. Em 2020, ocorreram também eleições municipais e, mais uma vez, a presença de mulheres nos espaços e na disputa política foi marcada por ataques a elas.
“Toda mulher que decide fazer política partidária sofre violência política de gênero. Normalmente, isso ocorre quando se desconsideram as ideias políticas tratadas pelas candidatas e passam a fazer considerações pejorativas sobre o seu visual, sobre sua vida moral”, declara a líder do PCdoB na Câmara, deputada Perpétua Almeida (AC).
“À medida que a mulher vai se afirmando, os métodos e a violência crescem. São Fake News, gritos em reuniões, podendo chegar a ameaças, na tentativa de amedrontar as
mulheres”, completa.
“A mulher vai se empoderando e vai sofrendo as consequências de ocupar o espaço. Mas ela só vai ocupar o espaço se fizer esse confronto”, destaca a deputada professora Rosa
Neide (PT-MT). “A chegada de uma mulher é a saída de um homem e isso acirra a disputa”, avalia a parlamentar, que diz que mesmo sendo 51,8% da população, segundo dados da PNAD Contínua 2019, as mulheres ainda ocupam poucos cargos eletivos.
Nas últimas eleições, o crescimento foi tímido; apenas 33,6% das candidaturas foram de mulheres, percentual ligeiramente maior que o registrado em 2016 (31,9%). Elas vão
comandar 658 prefeituras (cerca de 12% das cidades) e ocupar 9.196 cadeiras nas câmaras municipais, o que representa 16% contra 84% de homens, de acordo com o Tribunal
Superior Eleitoral (TSE).
No entanto, se falta representação, sobram casos de violência política de gênero, que se iniciam na a campanha e seguem até o exercício do mandato, para aquelas que chegam a ser eleitas. “Acaba se reservando a elas o espaço privado do lar, e nega-se o espaço público, mais ainda o espaço de poder”, lamenta Perpétua Almeida. “As mulheres são desestimuladas a entrar na política, são destratadas nos partidos e têm que brigar para serem ouvidas, mesmo quando eleitas. Sofrem ameaças verbais, físicas e, muitas vezes,
atentados e mortes, como foi o caso da vereadora Marielle Franco. Na última eleição, diversas vereadoras eleitas denunciaram à polícia as ameaças que vêm sofrendo”, completa a deputada acriana.
Além disso, segundo ela, o governo Bolsonaro caracteriza--se pelo autoritarismo na política, o ultraliberalismo na economia e a pauta retrógrada nos costumes. “Isso impacta especialmente as mulheres, com a perda de direitos, com o desmonte de políticas públicas contra a violência de gênero e a propagação de um papel conservador para elas”, observa.
Legislação
Em dezembro de 2020, a Câmara dos Deputados aprovou nove projetos prioritários, escolhidos pela bancada feminina para marcar os 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, entre eles, o Projeto de Lei 349/15 que dispõe sobre o combate à violência e à discriminação político-eleitorais contra a mulher. A matéria aguarda análise
do Senado Federal.
Entre outros pontos, o texto define o que seria a violência política contra a mulher e criminaliza condutas que possam impedir ou dificultar a campanha ou desempenho de mandato
eletivo de mulheres. A pena prevista é de um a quatro anos e multa, podendo ser aumentada em 1/3 se for gestante, idosa ou com deficiência. “Essas legislações são importantíssimas porque são inibidoras de atitudes discriminatórias e violentas que as mulheres enfrentam na sua caminhada política”, avalia a deputada Perpétua Almeida.
Na opinião da deputada professora Rosa Neide (PT-MT), esse enfrentamento é fundamental para trazer mais mulheres. “A presença da mulher nos espaços de poder, nos espaços eletivos, ajuda com que outras se encorajem, se empoderem e ocupem esses espaços”, comenta.
Em casa, mas desprotegidas
Além dos casos de violência política, com a restrição do ir e vir imposta pela pandemia, um outro fenômeno dá as caras: a exposição ainda maior da mulher a episódios de violência doméstica. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020, 648 mulheres foram vítimas de feminicídio no primeiro semestre do ano passado – número 1,9% maior que o mesmo período de 2019.
Segundo noticiado pela ONU Mulheres, diversos países registraram crescentes denúncias de violência doméstica, durante o período da pandemia, e um crescimento na demanda por abrigo de emergência. Em Cingapura e Chipre, as linhas de apoio tiveram um aumento de chamadas em mais de 30%. No Brasil, o anuário apontou um aumento de 3,8% nas chamadas para o 190 relacionadas a casos de violência doméstica, e uma queda de 9,9% dos registros nas delegacias, o que demonstra possivelmente a dificuldade que as mulheres têm encontrado para se deslocar até os pontos de denúncia.
Renata Albertim, diretora do Mete a Colher, rede colaborativa que ajuda mulheres vivendo em relacionamentos abusivos e tem prestado atendimentos on-line durante a pandemia, reforça que tem notado esse obstáculo. “As mulheres passaram a estar 24 horas do dia com o agressor e estão sem conseguir pedir ajuda, até mesmo falar no próprio celular”, alerta.
Outro desafio, neste momento, é a falta de investimento na rede de atendimento, segundo a vice-presidente do Instituto Maria da Penha (IMP), Regina Célia. “Os serviços da rede de proteção não funcionam a contento, porque os recursos são baixos”, adverte. Ela destaca a necessidade de investir mais na atualização e formação dos profissionais que trabalham nos pontos de atendimento à mulher, bem como na ampliação da infraestrutura da rede para que chegue em mais municípios.
De acordo com a socióloga Silvia Camurça, do coletivo SOS Corpo Instituto Feminista para Democracia, é preciso lutar no plano local pelas redes de assistência e pautar a necessidade de investimentos federais na proteção da vida das mulheres.